domingo, 1 de fevereiro de 2015

BOM PARA LER: 100 Animais Ameaçados de Extinção no Brasil


É um achado este amoroso e elaborado trabalho do biólogo e cientista ambiental Sávio Bruno. Estudioso sério, crescido entre a cidade e o campo, ele expressa suas preocupações como homem da ciência para que nós, leigos, possamos identificar o que está em risco, e nos aconselha sobre o que fazer, para ajudarmos a evitar a extinção dos animais que habitam, cada vez mais escassamente, o território brasileiro

José Eduardo Mendonça
Meu avô tinha um papagaio que falava palavrão - para total constrangimento de minha avó, ainda mais quando tinha gente de fora em casa. Na minha infância, e estou falando dos anos 1950, muita gente tinha um papagaio, que entoava Hino Nacional, de clubes, e todo tipo de papagaiada. Meu tio auferia parte de sua renda vendendo pássaros de lindo canto, como curiós - muitas vezes fui com ele a cidades então tão longínguas quanto Tietê ou Pirapora do Bom Jesus, em São Paulo, para aprisionar os bichinhos, que ficavam presos em um visgo. Também, da minha rua, no bairro de Pinheiros, via-se claramente no céu a imensa mancha branca da Via Láctea, e um número enorme de estrelas sobre nossas cabeças enquanto nós, meninos, jogávamos bola em uma rua que hoje, na mesma hora, está engarrafada pelo trânsito. Ninguém tem mais papagaio, ninguém mais vende passarinho e as estrelas do céu da cidade sumiram.

Não era nenhum problema termos animais domésticos além dos costumeiros gatos e cachorros - como micos, tartarugas, preás. Assim como podia-se comer, como eu comi, carne de paca, tartaruga, cobra. Não se falava de qualquer ameaça ao ambiente. Ele estava em torno, abundante, numa região na época predominantemente coberta por terrenos baldios, onde vivíamos nossas aventuras. Mas isso foi há meio século.

Hoje, como se sabe, as ameaças que pairam por conta das mudanças induzidas no clima pela atividade humana colocam em risco a biodiversidade de todo o planeta - o que se discute em encontro de cúpula em Nagoya, no Japão, no momento em que escrevo. Ainda há, hoje, muitos sabiás em meu quintal, e alguns outros tipos de pássaro que não reconheço. Há quinze anos, havia corujas na minha casa. Não há mais. Os sabiás estarão por aqui sabe-se lá até quando.

Por tudo isso, é uma pérola e um achado o amoroso e elaborado trabalho do biólogo e cientista ambiental Sávio Bruno. Um estudioso sério, crescido entre a cidade e o campo, ele expressa suas preocupações como homem da ciência para que nós, leigos, possamos identificar o que está em risco, além de nos aconselhar sobre o que fazer, para ajudarmos a evitar a extinção de cem animais que habitam cada vez mais escassamente o território brasileiro. “Fala, fala brasileira, que você enxerga tanta luz nessa capoeira”, disse Mário de Andrade. Poderíamos dizer também, “falem, animais, com seus cantos, seus ruídos de acasalamento, seus grunhidos, e continuem falando”, para a preservação do que nos é identitário - a quase totalidade das espécies escolhidas pelo autor ocorrem apenas em território nacional, e por vezes em partes ínfimas dele.

Além de nos remeter a um grande número de sites para que possamos saber mais sobre os animais ameaçados, ou para reportarmos e documentarmos e partilharmos dados que possamos ter coletado sobre eles, Sávio Bruno nos aguça a curiosidade com informações sobre os animais, todos devidamente registrados em fotografias, fundamentais para o reconhecimento.

Por exemplo: águias, como a cinzenta, uma das maiores do país, são, como outros rapinantes, responsáveis pelo controle natural da população de roedores, répteis e anfíbios, nos lembrando que não há nada que exista isoladamente, no mundo animal. Tudo é uma interação, e quando um pé de apoio se perde, vários outros no entorno se encontram em situação de risco. As águias cinzentas, que têm dois centros de visão em cada olho e podem enxergar muito, muito longe, estão sendo abatidas a tiros. O soldadinho-do-Araripe é um pássaro branco e vermelho de deslumbrante beleza, mas sua fêmea, que cuida da ninhada, é sabiamente verde, para se confundir com a paisagem. Os machos da baleia Jubarte emitem um canto que é uma sequência de formas sonoras repetidas, até mesmo com emprego de rimas. Papagaios (eles de novo) bocejam - coisa da qual só me dei conta depois de ler o livro e voltar para a infância. Há coisas chocantes, ainda: nos dias de hoje, apesar da proibição, o peixe-boi é caçado na Amazônia por um método singularmente cruel - quando o animal, o único mamífero aquático herbívoro, vem à tona para respirar, pescadores colocam rolhas em seu nariz. Assustados, eles mergulham e morrem afogados.

Sávio Bruno fez um trabalho brilhante, e de enorme importância. Num país ainda tão desigual, há necessidade de uma montanha de informação para que todos possam praticar o exercício da cidadania. A proteção da natureza faz parte deste exercício. Eu, se fosse ministro da educação, colocaria o livro em cada uma das escolas de todo o país.
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