quarta-feira, 20 de abril de 2016

De quem é esse jegue?



Nos últimos anos, o número de jumentos abandonados tem crescido drasticamente no Brasil e o problema se intensifica com a reprodução descontrolada.

Animais domésticos abandonados que perambulam sem destino são uma preocupação atual da nossa sociedade – seja por suas condições de vida ou pelo risco de acidentes de trânsito e transmissão de doenças. Porém, a grande questão que permeia o assunto é: como reduzir ou controlar o número de animais abandonados nas ruas, como os cachorros, gatos ou mesmo os jumentos, animais culturalmente utilizados no nordeste para o trabalho?

A população de jumentos, também conhecidos como asnos ou jegues, chega a aproximadamente 900 mil indivíduos só no Brasil, sendo que 90% desses estão no nordeste. Nos últimos anos, o número de jumentos abandonados tem crescido drasticamente e o problema se intensifica com a reprodução descontrolada.
Abate humanitário

Desde o inicio deste ano, no estado do Rio Grande do Norte, está em evidência o abate de jegues para alimentação humana. A exigência descrita no 


(RIISPOA), fiscalizada pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), deixa claro que animais domésticos (como bovinos, suínos e frangos) podem ser abatidos para o consumo humano. Dentre essas espécies legalmente permitidas estão os equídeos, ou seja, cavalos, burros, mulas e jumentos. A World Animal Protection defende, todavia, que todos os abates devem ser realizados de maneira humanitáriae em frigoríficos com inspeção.

No Brasil, existem plantas frigoríficas autorizadas a abater cavalos, mas muitas delas provavelmente precisariam ser adaptadas para funcionar de forma adequada a animais menores. Instalações feitas para outras espécies, como corredores projetados para cavalos, podem gerar sofrimento desnecessário. Devido ao seu porte pequeno, por exemplo, dois jumentos poderiam tentar passar ao mesmo tempo no local e acabar manejados incorretamente – sendo afastados um do outro por batidas de vara ou mesmo choques, de forma não humanitária.

Outro ponto importante a se considerar é o consumo desse animal: todos os produtos e subprodutos de uma espécie sacrificada para consumo humano devem ser aproveitados de forma consciente. A morte de um animal, considerado de produção, não é justificável se não for para alimentar pessoas e outros animais.
Soluções equivocadas

De acordo com uma reportagem do Globo Rural, programa transmitido pela emissora de TV Globo, o jumento foi substituído pelas motocicletas nos últimos anos como meio de transporte. A sua perda de função ocasionou um aumento no número de animais abandonados. Recolhê-los das ruas e não prover condições humanitárias, todavia, não resolve a situação. Tradicionalmente associados à agricultura, os jumentos podem produzir leite, ser de grande ajuda para a subsistência e transportar materiais e equipamentos, mas submetê-los a trabalho pesado e a maus tratos não deixa de fazer parte do problema.

Sacrificá-los para controlar a sua população também é ineficaz. Enquanto se sacrifica 10 jumentos, outros 20 estão sendo abandonados e maltratados nas ruas e estradas – alguns acabam amarrados, sem acesso a água ou comida; ficam sujeitos a atropelamentos e doenças; e em casos mais extremos, têm latas ou fogos de artifício amarrados em seu rabo, tornando-se vítimas de brincadeiras cruéis. A World Animal Protection acredita que somente a educação e a posse responsável com a castração são maneiras eficazes de controle e reduzem o sofrimento animal.

Seria muito simples sacrificar um animal e achar que o problema está resolvido, mas a verdadeira causa não esta sendo tratada. Podemos abandonar um dos animais ícones da paisagem e da cultura nordestina? Esse jegue também é nosso.

Por Paola Rueda, zootecnista
Supervisora de bem-estar animal da World Animal Protection no Brasil

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