O câncer é algo comum no reino animal. E para algumas espécies, a taxa de mortalidade é semelhante àquela apresentada entre os seres humanos que sofrem da doença.
Nossos cães e gatos são um exemplo de bichos que podem apresentar diversas formas de câncer, e estão em risco se são fumantes passivos, por exemplo.
Mas animais selvagens também são afetados. Muitos demônios-da-Tasmânia, um marsupial endêmico da Austrália, sofrem com tumores faciais devastadores que passam de uma espécime a outra pelo contato físico.
A poluição dos oceanos também representa um problema. Uma população de leões-marinhos da Califórnia é conhecida por apresentar câncer urogenital, em parte por causa disso.
No estuário do rio São Lourenço, no Canadá, o câncer de intestino é a segunda causa mais comum de morte de belugas. E, apesar do mito de que tubarões são imunes ao câncer, eles podem desenvolver o melanoma.
Mas há exceções. Alguns poucos animais não apresentam câncer com frequência – e outros, nunca. Entender por que isso acontece pode nos ajudar na prevenção e no tratamento dessa doença.
Tamanho não é documento
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O câncer ocorre quando uma célula aparentemente normal cresce descontroladamente. Normalmente, células velhas ou danificadas são destruídas. Mas às vezes uma delas continua a se reproduzir, criando cada vez mais células “ruins”. O resultado disso é um tumor.
Em tese, trata-se de um simples jogo de números: quanto mais células em um organismo e quanto mais ele vive, mais chances de que uma dessas células acabe sucumbindo a alguma mutação aleatória.
Mas nem todas as células são igualmente sujeitas ao câncer. Os elefantes, por exemplo, têm trilhões de células a mais do que nós e vivem muito. Mas apresentam uma baixa incidência de câncer – apenas 5% deles morrem da doença, enquanto ela mata uma em cada cinco pessoas.
Parte da explicação para isso acaba de vir à tona. Cientistas revelaram que o genoma do elefante contêm várias cópias de um gene conhecido por combater o câncer – enquanto temos apenas um exemplar desse gene, os elefantes têm 20.
Segundo Vincent Lynch, da Universidade de Chicago, esse gene atua em duas frentes: primeiro, impedindo que uma célula defeituosa se multiplique, dando a ela tempo para se “consertar”; segundo, se isso não ocorrer, o gene a impele a se auto-destruir.
“Em teoria, poderíamos desenvolver medicamentos que imitam esse processo dos elefantes”, afirma Lynch. Um desses remédios, chamado Nutlin, está sendo testado atualmente.
A incidência de câncer é surpreendentemente menor ainda entre populações da chamada baleia-da-Groenlândia, um dos maiores e mais longevos animais do mundo.
Cientistas que analisaram o genoma dessa espécie descobriram mutações que ajudam a impedir danos no DNA, protegendo-as do câncer.
Imune a tumores
Mas talvez seja o caso de um roedor o que mais surpreendeu os cientistas. Em geral, os ratos são extremamente suscetíveis à doença, apesar de viverem pouco tempo e terem menos células do que nós.
Mas o rato-toupeira-pelado (Heterocephalus glabe) oferece esperança para futuros tratamentos para o câncer.
Trata-se de um animal estranho, com a pele enrugada, sem pelos e com dentes incisivos enormes. Eles vivem até os 30 anos, muito mais que outros bichos do mesmo porte.
Além disso, eles são dotados de um mecanismo natural de defesa contra o câncer. Em décadas de observações, nunca um desses roedores foi vítima de um tumor.
Em 2013, a equipe de Vera Gorbunova, da Universidade de Rochester, nos Estados Unidos, descobriu que o rato-toupeira-pelado produz uma molécula especial que o impede de desenvolver tumores.
Trata-se de uma substância espessa e açucarada chamada ácido hialurônico, encontrada nos espaços entre as células do animal.
Mesmo se essas células sofrerem mutações, a susbtância impede que elas se multipliquem, como um escudo protetor.
Segundo Gorbunova, o ser humano também produz o ácido hialurônico, mas em uma versão ligeiramente diferente. “Estamos explorando novas maneiras de regular a produção dessa molécula e estimulá-la em humanos”.
Mas, por enquanto, ainda não se sabe se esses tratamentos vão funcionar bem entre seres humanos.
Para o oncologista David Vail, da Universidade de Wisconsin, deve haver um motivo para apresentarmos menos ácido hialurônico do que os ratos-toupeiras-pelados. “Pode ser que um alto nível dele seja tóxico para nós, por exemplo”, afirma.
O mesmo vale para a manipulação genética, pois um gene que ajuda um animal a combater o câncer pode causar outras doenças em humanos.
Mesmo assim, pesquisadores continuam com seus trabalhos na esperança de encontrar soluções para a doença. “Precisamos entender a biologia básica, senão não há maneira de intervir quando as coisas derem errado”, diz Lynch.
Fonte:
BBC BRASIL
Leia a versão original desta reportagem em inglês no site BBC Earth.
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