Pastor-alemão: uma das raças mais suscetíveis ao câncer
Atentos a essa situação, pesquisadores da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias (FCAV) da Universidade Estadual Paulista (Unesp), em Jaboticabal, criam alternativas para, de acordo com a tendência mundial, tratar e se possível curar os animais domésticos acometidos pela doença, para os quais há alguns anos só havia uma saída: eram sacrificados.
Em vez da amputação, procedimento padrão em caso de osteossarcoma, tumor responsável por cerca de 85% das ocorrências de câncer ósseo canino, a equipe da Unesp demonstra a viabilidade, em muitos casos, do implante de ossos, cuja eficiência tende a aumentar com o uso de novos materiais. Em um estudo publicado em março na Acta Cirúrgica Brasileira, um grupo de seis veterinários da Unesp atesta a possibilidade de uso no Brasil da resina poliuretana de mamona como cimento para o implante de fragmentos ósseos retirados de doadores saudáveis e conservados em glicerina à temperatura ambiente. Esse material substitui outra resina, o polimetil metacrilato, que libera gases tóxicos, desprende calor (chega a 70o Celsius) e pode provocar arritmias cardíacas.
Cimento de ossos
Os resultados se apóiam em um experimento com seis cães (quatro machos e duas fêmeas) sem raça definida, em cujas tíbias (o osso equivalente à canela da perna humana) se fez o implante. Cinco dos seis animais tratados apoiaram a pata operada no primeiro dia após o implante e corriam normalmente em média após um mês e meio. Nesse estudo, a resina de mamona – uma massa esbranquiçada usada para rechear o enxerto, no lugar da medula óssea retirada – deu maior resistência na fixação da placa metálica que faz o implante aderir ao osso original. E não desencadeou processos infecciosos, um resultado atribuído ao bom estado de saúde dos animais.
Em outros estudos em que se utilizaram os mesmos procedimentos cirúrgicos, exceto o cimento ósseo, adotado experimentalmente há cerca de seis anos nos Estados Unidos, um terço dos animais tratados, em média, apresentou infecção. No experimento feito na Unesp também não se notou a absorção da resina nem sua substituição por tecido ósseo novo. Por atuar como bactericida, dispensou o uso de antibióticos, imprescindíveis com a resina anterior, o polimetil metacrilato.
Tais evidências representam indicadores positivos para que a resina de mamona seja usada como cimento ósseo em uma escala mais ampla, no futuro, pelas clínicas veterinárias. Mas, lembra Carlos Roberto Daleck, da equipe da Unesp, o implante é uma alternativa à amputação somente se restar pelo menos metade do osso – o osteossarcoma, mais comum nas raças de maior porte, como o são-bernardo ou o doberman, é um tumor bastante agressivo, que muitas vezes leva à desintegração dos ossos.
A preservação dos ossos atingidos leva em conta também o bem-estar dos proprietários dos animais. “Há casos em que seria mais simples amputar o membro afetado e o animal deixaria a clínica andando tranqüilamente sobre três patas”, diz Daleck, “mas a idéia da mutilação costuma tirar o sono do dono do cão”. Em outro estudo recente, a ser publicado na Acta Cirúrgica, feito com dois grupos de seis cães, a equipe da Unesp de Jaboticabal mostrou que um medicamento chamado furosemida pode atenuar os efeitos indesejados, sobretudo as alterações nas funções renais, causados pela cisplatina, quimioterápico adotado para tratamento de câncer nos ossos, na bexiga ou nos testículos de cães, por exemplo.
Outro trabalho, publicado no ano passado no Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, reitera a importância do tratamento precoce ao detalhar as possibilidades de diferenciar, por meio do exame no microscópio eletrônico de transmissão, as alterações que ocorrem em um tipo de célula da pele, os mastócitos: à medida que o tumor evolui, o núcleo dessas células ganha volume, surgem grânulos no citoplasma e as rugosidades da membrana se tornam mais evidentes.
Com base nesses parâmetros, a equipe da Unesp curou 60% dos 108 cães atendidos nos últimos quatro anos com mastocitoma, o tipo de câncer de pele mais comum, que afeta especialmente buldogues e boxers a partir dos 8, 5 anos de idade. É muito difícil saber com precisão quais as raças mais afetadas e os tipos de câncer mais comuns entre os cães no Brasil. Um levantamento publicado na Archives of Veterinary Science, com base em 333 cães atendidos no hospital veterinário da Universidade Federal do Paraná (UFPR) entre 1998 e 2002, indicou que as fêmeas são mais suscetíveis que os machos, numa proporção de dois para um. Predomina o tumor de mama, encontrado em quase metade das fêmeas (45, 6%), com um agravante: na maioria dos casos (68%), tratava-se de lesões malignas.
De acordo com esse estudo, coordenado por Suely Rodaski, essa predominância pode estar associada ao uso de hormônios como método contraceptivo e à pouca atenção dada à castração precoce – a retirada dos ovários e do útero antes do primeiro cio reduz a quase zero o risco de surgimento de câncer de mama. A equipe do Paraná verificou também que, entre os cães com raça definida, o câncer é mais freqüente no pastor alemão (12, 61% dos casos atendidos), poodle (11, 41%) e boxer (10, 81%), com maior incidência entre os animais de 6 a 12 anos. Quando submetidos a cirurgia e tratamento quimioterápico, ganharam uma sobrevida de em média 19 meses.
O Projeto
Quimioterapia com Cisplatina em Cães
Modalidade
Linha regular de auxílio à pesquisa
Coordenador
Carlos Roberto Daleck – FCAV/Unesp
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