quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Em ratos, estresse do pai pode afetar o desenvolvimento de filhotes





Cada vez mais, os cientistas percebem que o DNA não é a única maneira pela qual um pai pode passar traços para sua prole. Acontecimentos vividos pelos pais ao longo da vida também podem ter um impacto no desenvolvimento de seus filhos.

Agora, pesquisadores da Universidade da Pensilvânia, nos Estados Unidos, demonstraram a nível molecular como passar por estresse altera o esperma de um rato macho de tal forma que ele afeta a resposta de sua prole ao estresse. Esta mudança é transmitida epigeneticamente – através de outros meios que não o código de DNA – por moléculas chamadas microRNAs, ou miRs.

O trabalho, liderado por Tracy L. Bale, professora de neurociência na Faculdade de Medicina Veterinária da instituição e da Perelman School of Medicine, fornece pistas importantes para a compreensão de como as experiências de vida de um pai podem afetar o desenvolvimento do cérebro e a saúde mental de seus filhos através de meios puramente biológicos, e não comportamentais.

“Para mim, é notável que o estresse aparentemente leve de um rato macho provocaria essa mudança substancial na resposta do microRNA e que ela iria ficar conectada ao curso do desenvolvimento de sua prole”, disse Bale em entrevista ao site Medical Xpress. O artigo foi publicado na revista “Proceedings” da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos.
 
Estresse genético

Em pesquisas anteriores, o laboratório da pesquisadora tinha mostrado que camundongos machos que eram estressados antes de se reproduzir (por medidas como a mudança gaiolas ou expondo-os ao odor da urina de um predador), tiveram filhotes com uma resposta “amortecida” ao estresse. 
Quando compararam o esperma dos pais estressados ​​com o de exemplares não estressados, os cientistas descobriram um aumento da expressão de nove miRs nos animais estressados.

Ao contrário de alguns outros tipos de RNA, miRs não codificam uma proteína; em vez disso, eles servem para silenciar ou degradar RNAs mensageiros específicos, impedindo-os de serem traduzidos em proteínas. “Apenas mostrar que os níveis eram diferentes não torna [a descoberta] relevante ou interessante. Queríamos descobrir se eles estavam tendo um papel causal”, conta a estudiosa.

Para descobrir isso, a equipe microinjetou os nove miRs em zigotos rato, que foram então implantados em camundongos fêmeas normais que os gestaram como “barrigas de aluguel”. Eles também incluíram grupos de controle em que os zigotos receberam uma injeção simulada ou uma injeção de um único miR. 
Quando os filhotes se tornaram adultos, os pesquisadores examinaram a resposta ao estresse, assim como haviam feito em seu estudo de 2013. “Os resultados mapeados exatamente o que tínhamos mostrado antes”, declarou Bale.

Quando submetida a um estresse leve – neste caso, ser presa por um período curto de tempo -, a prole que veio dos zigotos que receberam as injeções de multi-miR tinham níveis de cortisona mais baixos em comparação à prole nos grupos de controle. Os ratos no grupo de injeção multi-miR também tiveram alterações significativas na expressão de centenas de genes no núcleo paraventricular, uma região do cérebro envolvida na regulação do direcionamento do stress, sugerindo alterações difundidas no neurodesenvolvimento primário.
 
Soldados do RNA

Por fim, os pesquisadores tinham como objetivo determinar como os miRs realizavam esse efeito após a fertilização. Como os miRs são conhecidos por selecionar e degradar o microRNA, a equipe analisou o mRNA materno armazenado – um pacote genético que está contido dentro do óvulo quando se funde com o esperma e existe apenas por uma pequena janela de tempo para dirigir o desenvolvimento zigótico primitivo.

“As pessoas costumavam pensar que, porque o mRNA materno armazenado é traduzido durante aquele desenvolvimento inicial de duas células e de quatro células, a mãe tem um papel muito importante nesses estágios iniciais e o não tem papel algum”, disse Bale. “Porém, nós acreditamos que talvez esses miRs do esperma poderiam estar atacando este mRNA materno e direcionando quais mRNAs são traduzidos”.

Os pesquisadores injetaram novamente miRs em zigotos e realizaram injeções de controle, mas, desta vez, eles incubaram os zigotos por oito horas e, em seguida, ampliaram o RNA em cada célula para procurar os níveis de expressão genética. Eles descobriram que, de fato, a injeção multi-miR parecia estar atacando o mRNA materno, resultando numa redução nos níveis de mRNA em comparação às injeções de controle. Os genes envolvidos na remodelação da cromatina foram especificamente afetados.
 
O papel do cérebro

Bale suspeita que quando um macho passa por experiências estressantes, isso pode desencadear a liberação de miRs contidos em exossomos de células epiteliais que revestem o epidídimo, o local de armazenamento e maturação do esperma entre os testículos e os vasos deferentes. Estes miRs podem ser incorporados no esperma em maturação e influenciar o desenvolvimento na fertilização.

O próximo trabalho do grupo é examinar quais fatores iniciais poderiam levar à liberação de exossomos e miR e se uma intervenção, tais dar aos machos estressados um enriquecimento ou uma recompensa, pode impedi-los de transmitir uma resposta ao estresse anormal para a próxima geração.

Eles também esperam estudar o papel dos miRs em seres humanos para discernir se alguns podem variar em resposta ao stress de uma maneira semelhante a que acontece com os camundongos.

O trabalho foi financiado pelo Instituto Nacional de Saúde Mental dos Estados Unidos. 
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