segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

Pesquisadores brasileiros sugerem forma ampliada de avaliar riscos de extinção de espécies

O fim-fim (Euphonia chlorotica) é uma das aves brasileiras em risco
O fim-fim (Euphonia chlorotica) é uma pequena ave brasileira que habita ambiente de floresta

Mudanças ambientais, provocadas ou não pela ação do homem, têm impacto na vida selvagem e estão refletidas na extensão da Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas publicada pela União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em inglês). A listagem com 71.576 nomes de animais, plantas, fungos e microrganismos é a base para a elaboração de políticas de conservação mundo afora. No entanto, pesquisadores da Universidade Federal de Goiás (UFG) sustentam que a lista não deve ser o parâmetro único para planejar ações de conservação, pois aspectos ignorados pela IUCN podem colocar em xeque o êxito das medidas. Os pesquisadores brasileiros sustentam que é necessário avaliar a saúde dos ecossistemas em sua totalidade e não tomar isoladamente o risco de extinção de cada espécie.

Para fornecer dados mais fidedignos, os pesquisadores da UFG criaram um modelo para quantificar o risco de desaparecimento das espécies. Quase todas as aves do Brasil constam da tabulação feita para o trabalho científico, somando 1.557 espécies. Os brasileiros foram abrangentes, levaram em conta dados como a influência humana (caça, comércio ilegal, desmatamento), a dieta dos animais (se se alimentam de frutas, folhas, insetos), além do ambiente em que vivem (floresta, ambiente aberto, savana), os hábitos (noturno ou diurno), a quantidade de ovos por ninhada e o tamanho dos bichos, além de 15 outras variáveis.

“Aplicando nosso modelo, somos capazes de prever se o animal ou planta têm, por exemplo, 30%, 40% ou 80% de chance de se extinguir em determinado momento. Descobrimos que a maioria dos exemplares de aves mais ameaçados de nosso país não estão sequer em áreas protegidas”, explica o professor Rafael Loyola, co-autor, com a doutoranda Nathália Machado, do artigo A Comprehensive Quantitative Assessment of Bird Extinction Risk in Brazil, publicado na edição de agosto da revista PLoS ONE.

A IUCN, por outro lado, aplica somente 12 critérios para definir se uma espécies está em perigo ou não. Tamanho da população, número de indivíduos maduros, taxa de declínio, fragmentação das populações e área de ocorrência são alguns das variáveis usadas. Dessa forma, cada espécie recebe da IUCN uma etiqueta específica – dados insuficientes (DD), pouco preocupante (LC), quase ameaçada (NT), vulnerável (VU), em perigo (EN), criticamente em perigo (CR), extinta na natureza (EW) e extinta (EX).

Os pesquisadores esperam que o modelo auxilie em mais um parâmetro, a probabilidade de extinção, capaz de melhorar o planejamento das políticas ambientais. “O estudo amplia o conhecimento sobre o grau de ameaça das espécies e isso tem um peso político enorme, porque o governo só tem condições de tomar decisões mais eficientes quando conhece o nível de ameaça a uma espécie. Por exemplo, pode-se intensificar a fiscalização a uma região específica ou criar áreas de preservação para impedir a degradação daquele ecossistema”, afirma Loyola.

Características ecológicas e histórias evolutivas
O outro artigo produzido pelo Departamento de Ecologia da UFG, intituladoConservation Actions Based on Red Lists Do Not Capture the Functional and Phylogenetic Diversity of Birds in Brazil e também publicado na edição de setembro da revista PLoS ONE, aprofunda o entendimento sobre as características ecológicas e histórias evolutivas de cada ave brasileira no ecossistema em que vive. São aspectos pouco avaliados pelas políticas de conservação, e isso inclui a Lista Vermelha da IUCN.

O objetivo dos cientistas foi avaliar o nível de diversidade funcional e de diversidade filogenética de ambientes para saber se os mesmos são saudáveis. Com essa informação em mãos, contam os autores do estudo, a aplicação de políticas de conservação teria maior impacto. A classificação poderia, por exemplo, ajudar a determinar quais regiões terão melhor resultado dentre aquelas que já estão muito degradadas, e que precisam de outras intervenções.

O nível de diversidade funcional diz respeito à diferença ecológica entre as espécies presentes nos ecossistemas. Quanto mais alto é o índice, mais “saudável” é o local, porque ali existem espécies com múltiplas funções e isso garante o equilíbrio natural. “Quando há espécies ecologicamente muito diferentes habitando o mesmo ambiente, espera-se achar ali aves que desempenhem papéis diversos, tais como dispersão de sementes, polinização e predação, diz o professor Loyola, que também participou do estudo, e que tem co-autoria do mestrando José Hidasi Neto e de Marcus Cianciaruso, também professor da UFG.

Já o nível de diversidade filogenética indica o quão diferente são as espécies daquele ambiente do ponto de vista evolutivo. “Usamos como exemplo a ema, que é uma grande ave que não voa e ocorre em áreas abertas, ao contrário do fim-fim (Euphonia chlorotica), que é pequeno e habita ambiente de floresta. Essas várias linhagens (ou grupos evolutivos) convivendo na mesma área atestam a saúde de todo do ecossistema”, explica Loyola.



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